Expulsão de Militar por Envolvimento em Atos Antidemocráticos
Brasil – A Marinha do Brasil encontra-se na fase conclusiva de um processo que pode levar à primeira expulsão de um militar das Forças Armadas, devido à sua participação nos ataques às sedes dos três Poderes em 8 de janeiro de 2023.
O suboficial da reserva, Marco Antônio Braga Caldas, de 51 anos, está sendo julgado por um Conselho de Disciplina, com previsão de término em maio. O procedimento foi iniciado após o STF (Supremo Tribunal Federal) condená-lo a 14 anos de prisão sob a acusação de crimes contra a democracia.
A possível expulsão poderá desencadear uma série de decisões desfavoráveis a militares envolvidos nos eventos de 8 de janeiro ou na conspiração golpista de 2022. Tanto a Marinha quanto o Exército tiveram ex-comandantes denunciados pela PGR (Procuradoria-Geral da República).
Denúncia e Consequências
O almirante Almir Garnier Santos, ex-chefe da Força Naval, tornou-se réu no final de março por suspeita de apoio militar aos planos golpistas do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A Marinha só deve instaurar um processo contra ele se houver condenação pelo STF.
Funcionamento do Conselho de Disciplina
O Conselho de Disciplina é um órgão destinado a julgar militares suspeitos de infrações disciplinares ou condenados a penas superiores a dois anos pela Justiça comum. No caso de Caldas, será decidido se ele deve ser desligado da Marinha após sua condenação pelo Supremo.
O processo pode durar até 50 dias. Em casos como o de Caldas, onde se analisa uma condenação civil, a decisão final pode ser submetida ao comandante da Marinha após a recomendação do conselho.
Dois almirantes consultados pela reportagem preveem a exclusão do suboficial dos quadros da Marinha. Se isso ocorrer, sua aposentadoria será transferida para sua família.
O suboficial ainda poderá perder o direito de permanecer encarcerado em uma unidade militar. Ele cumpre pena na Escola de Aprendiz de Marinheiros, em Florianópolis, desde junho de 2024. A Marinha busca transferi-lo para uma unidade no Rio de Janeiro, mais adequada para militares condenados.
Defesa de Caldas
O advogado Douglas Eduardo afirmou que o processo na Marinha é independente da condenação no STF.
“A análise do conselho não está vinculada aos fatos apurados no processo criminal, tampouco a seu resultado, mas considera o contexto geral da conduta do militar, levando em conta sua condição de militar da reserva remunerada e o direito à liberdade de expressão garantido por lei”, afirmou.
Douglas defende que a participação de Caldas foi pacífica e não caracteriza infração disciplinar. Ele elogiou o Conselho de Disciplina por sua atuação com “brilhantismo” e respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa.
“Conforme restou comprovado nos autos do Conselho de Disciplina, o acusado, suboficial Caldas, absolutamente não infringiu qualquer regra ética mínima e/ou feriu o decoro militar tipificado no Estatuto dos Militares, capaz de legitimar sua expulsão da Marinha do Brasil, eis que sua mera presença naquele dia e local não tem o condão de caracterizar a inobservância de qualquer preceito militar a ele aplicado”, completa.
Marco Antônio Braga Caldas, que era mergulhador da Marinha, deixou o serviço ativo em 2021, após cerca de 30 anos, e passou a residir em Balneário Piçarras (SC).
Ele chegou a Brasília em 8 de janeiro de 2023, em uma excursão gratuita, e afirma desconhecer quem financiou a viagem. Sua intenção, conforme relatou, era protestar contra a eleição do presidente Lula (PT), devido ao histórico judicial do petista.
A denúncia da PGR aponta que Caldas participou de uma caminhada com apoiadores de Bolsonaro (PL), desde o Quartel-General do Exército até a Esplanada dos Ministérios.
Ele foi detido no Palácio do Planalto. Seu celular, confiscado pela Polícia Federal, continha fotos e vídeos do suboficial no térreo e no segundo andar do edifício do Executivo.
Em audiência no Supremo, Caldas negou envolvimento na destruição. Ele afirmou ter defendido um policial militar que estava sendo agredido por manifestantes e buscou abrigo no Palácio do Planalto.
O suboficial permaneceu preso de janeiro a agosto de 2023, já denunciado pela PGR. O ministro Alexandre de Moraes, do STF, autorizou sua libertação, considerando que todas as provas já haviam sido coletadas, e que a liberdade de Caldas não representava mais risco para as investigações.
Antes do julgamento, o militar enviou uma carta aos ministros da corte, mencionando suas décadas de serviço na Marinha para defender sua inocência.
“Gostaria de enfatizar a Vossas Excelências que sou um cidadão brasileiro, cristão e casado, que espera ser julgado com base na crença de estar participando de uma manifestação pública e pacífica, e não pelos atos cometidos por uma parte que resultaram em danos ao patrimônio público.”
Caldas destacou ser um “ardente defensor do Estado democrático de Direito” e que pretendia participar de uma “manifestação pública pacífica”.